sábado, 30 de dezembro de 2017

Poema Simpático

Pessoas vêm,
Pessoas vão.
Nunca diga um simples sim,
Nunca diga um simples não.
Aos poucos você conhece enfim
A oportunidade de seu coração
E o som da sua canção.

As rosas tem espinhos
Não me nego afirmar
Mas quão bela são as rosas
Que os espinhos conseguem formar?
O mundo feito de rosas é
perfeito você pode concordar.
Mas somente vale rosas que
deixam seus espinhos tocar.
E as que tocam com rosas nossos espinhos
não tem como não amar.

Rosas vêm,
Rosas vão.
Nunca goste de uma simples espinho,
Nunca goste de uma simples rosa em vão.
Aos poucos você conhece sozinho
E adora sua canção
Sem rima, mas com o coração.

Trecho de Outrora
Por Jayme Mathias Netto
vivisseccao.blogspot.com

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Sangue

Dizem que o sangue é um fluido vermelho, abundante em nosso corpo e que é responsável por funções muito importantes para a manutenção de nossa vida. A genética vem nos mostrando que nele, como em muitas outras partes do corpo, estão estruturas que carregam informações que são passadas entre as gerações, oferecendo, então, os caminhos pelos quais as formas de nosso corpo e mente serão desenhadas. A ciência genética avança, é verdade, mas não precisamos dela para saber dos prodígios espirituais e fenomênicos desse líquido que está presente nas veias de cada um de nós - afinal, antes de nosso tempo, Jesus já não sabia que era descendente de Davi, sendo filho de José, e este de Jacó, e este de Matã, e assim por diante até que se chegasse no patriarca Abraão? O sangue é o pré-requisito do tempo. O sangue é permanência e ruptura ao mesmo tempo; o sangue é a dialética encarnada. Ao invés de representar uma determinação natural, uma fatalidade biológica, através das quais os homens e mulheres seriam cópias uns dos outros nas suas diferentes gerações, é nele que as milhares de possibilidades de combinações pela via da mistura de dois códigos genéticos acontecem. Pelo sangue, a Maria assemelha-se a Raimundo, seu pai, no que este tem de inquieto, questionador, insubmisso. Mas enquanto este é saudoso de seu "velho tempo", onde o mundo era melhor, aquela busca as rupturas das estruturas de hoje para que o futuro represente as possibilidades de uma vida melhor. O sangue que corre num, corre na outra, mas como esse fluido é o lugar das possibilidades infinitas, ele também representa a substância capaz de dar passagem aos novos espíritos nascentes dos novos tempos. Mas, deixadas de lado as ilações distantes, resta-nos perguntar: de que forma, realmente, o sangue se manifesta em nós? A resposta desta pergunta é o motivo d'eu ter feito este texto. É muito estranho, mas também incrivelmente bonito, ver como o sangue que corre em mim e que corre em meu irmão faz com que nos façamos parecidos, tenhamos um jeito de falar parecido, tenhamos cabelos parecidos, olhos da mesma cor. No meio da caoticidade, dentre as zilhares de possibilidades das coisas acontecerem de maneiras infinitamente distintas, duas pessoas podem partilhar de certas características, ocasionando o fato delas poderem se identificar como pertencentes a algo comum entre uma e outra. Eu e minha mãe temos os mesmos olhos, e ainda partilhamos da mesma personalidade, dizem. Reconhecemo-nos como seres aparentados, e esta palavra é rica: aparentados em aparência, mas, também, aparentados em parentesco. E o sangue que corre verticalmente, corre horizontalmente, e lá vai você aparentar-se aos primos. São todos muitos diferentes, mas são todos aparentados, ao final. Por fim, digo que dizem que o capitalismo acabou com o sangue, que o individualismo vem minando as sociabilidades derivadas desse fluido, marca tão característica de tempos pretéritos. Isso pode ser verdade, e esse pode ser realmente um dos intuitos da modernidade capitalista. Mas a questão é se isso vai se tornar realidade: na guerra entre sangue e capitalismo, a vitalidade do espírito humano que transcende gerações irá perecer? Eu acredito que não.

Por Willem Carneiro
vivisseccao.blogspot.com

domingo, 24 de dezembro de 2017

Eu tenho que...

Eu não tenho que te convencer.  
Não tenho que procurar os melhores argumentos para fazer com que você aceite o que penso.
Eu não tenho que ser compreendido.
Não preciso fazer com que você entenda que eu não quero ser concebido.
Eu não tenho que dizer nada.
Não preciso continuar falando asneiras e fingindo que todas elas fazem sentido.
Eu não tenho que dizer o que eu sinto.
Não preciso bradar aos quatro cantos minhas pulsações nervosas que jamais adentram num texto escrito.
Eu não tenho que ser feliz.
Não preciso ir aos domingos no zoológico com a família dar pipocas aos macacos.
Eu não tenho que ser solidão.
Não preciso conviver mais comigo na procura do que não sou.
Eu não tenho que ser.
Não preciso afirmar aquilo que não é.
Por Paulo Victor Albuquerque
vivisseccao.blogspot.com

domingo, 17 de dezembro de 2017

Poesia Express

De repente a rima do repente não é mais assim, tão boa.
A estrofe, uma catástrofe de versos que provocam o inverso do que propôs o poeta.
A melodia se torna repetitiva.
As cores daquele quadro parecem as mesmas dos outros três anteriores.
Não há mais fantástico. Tudo é plástico, estático, mecânico.
Fruto de um ou dois minutos de reflexão. Da "necessidade".
De repente tudo é monocromático, idiossincrático, dependente de uma série de acontecimentos do dia a dia.
A rotina que passa pela retina enfeitada por um ou dois frufrus.
Tal como um macarrão instantâneo, surge mais um feto, sem muito afeto, fruto de um aborto poético.
Aquele poema ok.
Quantos likes ele merece?
Dentro de quantos "amei" cabe a alma de um poeta?
A poesia só é bela quando não necessita. Ela mesma se basta.
Comove por ser perfeita, fechada em seu universo ao mesmo tempo em que se abre aos encaixes de quem a aprecia. Se transforma a cada olhar.
Desdobra a cada declamar, lágrimas, raiva, amor.
Quanto likes valem o aborto de uma idéia? Que se florescesse amanhã seria eterna, mas que hoje torna-se uma frase efêmera de Instagram.
Não aborte sua poesia!
Proteja-a como a cria de uma leoa feroz.
Alimente-a com as mais belas expressões do seu eu. Faça dela foz.
Para que na hora certa ela desemboque para o mundo e seja para ele, mais que uma frase de para-choques.

Por Júlio César Barbosa Dantas
Vivisseccao.blogspot.com

domingo, 10 de dezembro de 2017

Muníficos homens que ainda há

Já amanheço ...
o dia farto de alvura, ínclito

Antes inundado em negrume do dia
que anoiteço, insólito

À espera de um otimismo
interino

Do ponto de vista de quem tem
medo...

Mas no meu horizonte
é escolha

é em minha vitalidade que
essas ideias aferrolham...

No meu âmago
eu sou régio

A minha esperança
eu balizei como meu projeto...

E os a mim iguais, penso
“que mal há?”

Tem gente que quer é amor
e a rara alacridade do dadivar...

Por Jayme Mathias Netto

domingo, 3 de dezembro de 2017

O bote

O inverno chegou no sertão. A água que cai derrete o solo numa lama pastosa que atola o pé dos dois meninos felizes que correm embrenhados nos mato. Eles correm pois a chuva anuncia a chegada da grande serpente que engole tudo pela frente. O anseio dos dois é de fazerem parte do bucho da gigante, desejam serem engolidos em uma abocanhada só.

lá está ela, seu movimento é ligeiro. A cascavel feroz agita a cauda ao avistar suas duas presas. O ataque é certeiro. Não há saída. A digestão da fera consome os meninos por inteiro.

Após o descanso do bicho os dois são expelidos e voltam para sua casa alegres como se eles é que tivessem feito a refeição. “Que animal magnífico!” Pensava Emanuel consigo. “Pena que só fica aqui enquanto chove”. Mal sabia Emanuel que aquela foi a última vez que ele fôra engolido pela serpente.

No dia seguinte receberam a visita de um homem muito ilustre que até mesmo seu nome era subjugado pela alcunha de Doutor. Bicho da cidade, homem da ciência, inteligência incontestável. Ora, logo os meninos se aperriaram para mostrar o bicho que eles encontraram no meio dos mato, ver se o Tio Doutor gostaria de conhecer.

Enquanto caminhavam, Alberto imaginava o espanto que seu Tio iria receber com o bote da serpente, sorria sozinho enquanto andava construindo sua imaginação. Lá está ela. Os dois fecham os olhos. A respiração pára esperando o bote. Nada. O Doutor imóvel fala. “Mas isso é só um rio”. Morte. A morte da serpente estava anunciada. O homem da ciência proclama o seu sepulcro.

Os invernos se passaram e Emanuel nunca mais voltou para o ventre da serpente, a terra rachada ou a lama sebenta refletiam na melancolia do seu olhar. Alberto, por sua vez, tomou outra escolha, decidiu fugir da terra dos homens e ir morar no bucho da cascavel, pois somente lá ele era feliz.

Certa vez me embrenhei no meio dos mato e perguntei para a chuva: “O que vale mais para uma única vida, a realidade do barro ou a felicidade da serpente?”.       

Paulo Victor Albuquerque
vivisseccao.blogspot.com