domingo, 28 de janeiro de 2018

Carta para a inspiração

Oi,

ouvi dizer de você por meio de alguns amigos. Escrevo essa carta, porque acho que fui bloqueado das suas redes sociais, portanto nada mais justo do que um velho e bom "manuscrito" para dizer o que realmente importa.
  faz aproximadamente um mês que não tenho visitas suas, nem sinais de que você pensa em aparecer. Fora aos domingos de madrugada, lá pelas duas quando, com insônia, tento lembrar de quando éramos bons amigos, de quando viajávamos juntos brincando com palavras e versos, perversos como crianças mal intencionadas. Livres do julgo da aceitabilidade. Certos do sopro da contemplação.
Ainda tentei gritar pelo seu nome, mas você estava longe demais e pareceu não querer escutar.
É muito difícil ter de deixar o orgulho de lado e assumir que não tenho sido o mesmo sem você.
  Os filmes, os livros são apenas sequências de palavras vazias. Sem a nossa parceria, nem mesmo a velha receita de rimar flor e amor tem funcionado.
  Meus dedos tem se perdido em conversas vazias pelo whatsapp. Meus olhos em reality shows baratos e fotos no Instagram. Algumas vezes são as suas com outros amigos, em blogs de arte, poesia e em textos que eu sei que foram escritos com você ali do lado, com aquele seu velho tom, quase que turrão, quando fala: "Assim não! Assim você sente quando lê? Ou apenas lê?Isso não é manchete de jornal não rapaz!"
  A verdade é que está tudo mais difícil e  por muitas vezes tenho pensado em desistir, porque me dói ter que saber, por terceiros, que você comprou as ideias deles, que são aplaudidos e admirados.
Tudo que eu queria era a nossa cumplicidade de volta.
Não pelos outros, mas porque me revolta, nas poucas vezes em que empunhei a caneta e consegui escrever, não sentir. Porque sou o que sinto quando leio o que escrevo. E você me ensinou a ser assim.
Espero que saiba que nem a Experiência, aquela velha senhora de quem  tinha lhe falado,  aquela que a dona Idade vem tentando me empurrar como melhor amiga toda vez que erro; nem mesmo ela tomará o seu lugar.
Só você me faz tirar um coelho da cartola sem farsa, pura mágica e escrever, em qualquer superfície plana, a verdade plena que vai além da oração subordinada.
Saiba que  anseio a sua volta, estou sempre a sua espera, será sempre bem-vinda, após as minhas vírgulas ou entre as minhas aspas. Que não seja esta carta o nosso ponto final.

Do seu melhor amigo,

O Poeta.

Por Júlio César Barbosa
vivisseccao.blogspot.com

domingo, 21 de janeiro de 2018

Crônica sonâmbula

Eu gosto de dormir.
São 8 horas de sono todo dia. Das 24 horas são 8. Um terço do dia, durmo.
Para cada três, um é sono.
Se eu dormisse 24 horas ganhava três dias de vigília.
E assim se engrandeceriam as proporções…
Se fossem 30 dias dormindo, seriam 90 dias acordados.
Um ano, três me traziam.
Se eu dormisse 30 anos, tinha mais noventa.
Se todos nós antes de viver dormíssemos 30 anos, o mundo teria as cápsulas de sono para as pessoas dormirem desde quando nascessem. 
E depois amanheceriam seus dias e longas noites sem ficarem sonâmbulos por 90 anos.
Mas também não sonhariam, porque de tudo já haviam sonhado.
E já não teriam medo do que imaginavam porque já viveram vários pesadelos que permaneceram sem conseguirem acordar de volta e falar “Ufa! Era um sonho!”. Ficaram nesses pesadelos até o fim. Conseguiram esperar passar, por mais demorados que fossem.
E as coisas boas já tinham também imaginado em sonho e até vivido. Não teriam o “ai que pena! Jurava que era real, quero continuar sonhando.” Já haviam passado tim tim por tim tim o sonho que sonharam de bom.
E quando acordassem, todos diriam “bom dia” para várias noites e vários dias, até o resto da vida. 
Mas também ninguém sonharia em vida, só relembrariam de coisas que já tinham vivenciado. Passariam por ruas e alamedas desconfiando que já tinham por ali passado.
E como ninguém, a não ser os que já estivessem dormindo, iria descansar, íamos todos ficar a labutar e depois tínhamos folga a noite sem dormir, só festejar, ir aos bares ou contemplar o nada fazer. Isso se os poderosos tristes e fracos não construíssem logo logo empregos de vinte quatro horas seguidas. Porque eles mesmos, os poderosos, pouco podem na vida. E as pessoas não descansariam até sua morte. O lazer seria coisa pouca porque já tinham passado o tempo do descanso.
O descaso geral seria para os hotéis, hospedarias, pousadas que não iam precisar de cama. Os apartamentos já não teriam quartos, bastava uma sala para conveniência dos amigos e visitas e os armários para guardar as coisas. As camas seriam todas reservadas para os que ainda dormiam no berço. Já as casas noturnas, os cabarés, os bares, restaurantes e tudo que contempla o lado mais escuro do dia seria sempre lotado, afinal poucos aturariam ficar em casa de madrugada.
Teríamos enormes berçários nos hospitais. Afinal só teríamos camas em duas ocasiões: nas doenças e ao nascer. Não precisaríamos de descansos que necessitassem de cama. Nela já tínhamos estado muito.
As pessoas só descansariam, mas nunca chegariam à profundidade do sono. Nem fechariam os olhos por horas seguidas. Todas acordadas, quantas revoltas, quantas revoluções fariam os humanos. Haveria guerra fácil, porque os insuportáveis não suportariam a vida. 
Quantas virtudes nunca se revigorariam porque ninguém mais amoleceria o coração ao anoitecer. 
Ninguém mais saberia atuar e ser o espectador ao mesmo tempo. Coisa que só se faz em sono. Apenas atuariam, sem perceber o que olhar. Atores, mas não autores. As coisas secretas de nós mesmos que vem no sonho seriam coisa que jamais acessaríamos. 
Os sonâmbulos seriam os únicos bem vindos nesse sentido. Porque eles conseguiriam resgatar aqueles estados do início da vida. Sonhariam acordados como os loucos. 
E os loucos julgariam que eram capazes de dormir e sairiam dizendo nas ruas que coisa grande era aquela novidade e que importância suas vidas tinham. O poeta anunciaria que deveríamos ouví-los, pois era o sonho que haviam sonhado depois de trinta anos. Ninguém acreditaria que eles tinham conseguido isso. 
E para todo o resto que não sonhara em vida, na labuta de seus patrões tristes, apenas se encerrava a vida sem sonho. A morte era o puro cansaço de uma vida que nunca mais sonhou. Era a bênção tão prometida, recompensadora do vazio da vida.
Nada disso é muito distante do que hoje fazemos sem sonhar, sem descansar, sem viver, mas também sem morrer.

Por Jayme Mathias Netto
vivisseccao.blogspot.com

domingo, 14 de janeiro de 2018

Mito da caverna

Lá encontrava-me EU sentado sobre minhas pernas numa posição meditante, na procura do animal que representaria as entranhas de meu SER. Seria EU um camelo, um leão ou um bicho criança? Perguntava-me enquanto adentrava na caverna do meu EU. A cova em que EU me encontrava era gélida com um teto coberto por lanças pontiagudas feitas de água congelada. Pertencia às entranhas da terra junto a uma montanha que expelia um som proveniente do cosmos. O tempo passava e quanto mais Eu caminhava sob as profundezas do meu Ser, mais calor sentia enquanto o teto da caverna desmoronava. Não era justo comigo, “Logo Eu que estava passando por um momento tão difícil”, precisava encontrar esse bicho que habita em mim. “Conhece-te a ti mesmo”, dizia meu demônio enquanto eu procurava. As paredes derretidas começaram a formar um rio que me arrastava ao âmago do meu ser. As águas vão chegar no topo, eu luto para me manter vivo na esperança de ainda encontrar a fera que habita em mim, quero me segurar em algo. O grito que ecoa do abismo não passa de resquícios do meu ego. Submerso na água volto ao útero.
Adentrou a caverna comandado pelo demônio na procura de um bicho de si. Chegando às profundezas foi engolido pela montanha do não SER.

Por Paulo Victor Albuquerque
vivisseccao.blogspot.com

domingo, 7 de janeiro de 2018

Bossa de aviso

A quem interessar possa, escrevo essa bossa, na esperança de sangrar.
Para ser levado a sério, o amargo deletério, do mistério que é amar.

Para que  a cabeça tonta, que das tantas voltas, não se esqueça que errou.
Por não saber que a dor do peito dizia respeito a quem sofre de amor.

A quem acaso queira, é dessa maneira que canto pra precaver.
Aos pobres desavisados dos diversos maus bocados da ciência do sofrer.

E se mesmo com esta cantiga ainda quiseres aventurar-se neste mar.
Saibas que é por conta e risco,
que atissas este bandido perigoso que é amar.

A quem agora chora, digo sem demora que ainda avisei.
Que tome estes versos como um amargo remédio do desobediente a lei.

A quem outrora possa duvidar dessa bossa, de quem só quis ajudar.
Que porventura possa, essa melodia torta, vir a se concretizar.

Caro amigo eu só espero, que nunca lhe seja severo o que acabo de escrever.
De que esteja errada a máxima, de  quem um dia disse que amar era sofrer.

Por Júlio César Barbosa
vivisseccao.blogspot.com