domingo, 26 de novembro de 2017

Desafinado

Acorda, a corda que segura a melodia do teu juízo arrebentou.
Arranje um arranjo que concorde com os acordes dessa canção melancólica.
Que segure o som do fracasso mesmo com uma corda de aço a se fazer faltar.
Afine, afim de que o fim seja a mais doce e fina melodia.
Porque a música da sua vida não para, ainda que não haja cordas.
Mesmo que o único som seja o do passar das horas no relógio a estalar.
Invente uma forma de com as cordas restantes se reinventar, mesmo que numa reviravolta impressionante, encontre uma dissonante que teima em contrariar a harmonia das tuas ideias.
Encontre o contratempo e o vire ao seu favor.
E se mesmo assim, a música desafinar, toque com suas cordas quebradas, da maneira que for.
Porque na música da vida, o silêncio é a morte.
Júlio César Barbosa
vivisseccao.blogspot.com

domingo, 19 de novembro de 2017

Filosofada

No solipsismo contemporâneo. Cada ente na sua casca. Cada carapaça protegida em nome de uma pérola de uma ostra morta. O ente doente de tanta especificidade.
Nas cidades, a pressa de uma dobra tão difícil quanto rara. Os sinos na igreja anunciam que uma dobra é só um som para os solipsistas. Eles, cheios de experiências, bradam por um eu que não lhes pertence.
O ente do ente, doente de solipsismo, porque é especialista em contemplar seu próprio umbigo, apequenou tudo. Diz ser capaz de ter amigos, mas como isso seria possível se só a mônada lhe resta como abrigo?
Sem janela e sem portas, o pobre coitado. Isso não lhe cabe, porque tocar no ser como mais que a totalidade dos entes é coisa pra quem sempre gosta de dar uma filosofada, para quem rasga a carapaça e arregaça as mônadas, como fizera com as mangas da camisa na coragem.
Rasga os entes e a especialidade com rebeldia e só ai é que nasce o filósofo, com pérolas e argumentos, com vontade de vida. Um alfaiate que rasga e costura carapaças especialistas. Cria sua cordialidade e sempre renasce como um possível dual, trial, múltiplice em máscaras que vão e voltam do ser. É um vírus, não uma doença. O drible que se faz em si e no outro, dribla porque vai e volta sem fronteira. Em vez de ficar na doença do "cada um no seu quadrado" é convalescente e abre a totalidade. Sua tarefa é leve porque desliza nas ostras abertas, quebra carapaças e desvaloriza as pérolas especialistas podres. Ele arranca do ente uma forma do ser. E tudo ele sabe ser capaz de dobrar. Dobra novamente as mangas que costura e agora recomeça sua mais bela atividade em outros entes, outros solipsistas, outras especialidades. E o ser sempre cochicha com amor e generosidade no seu ouvido que ele é uma colcha de retalhos desapercebida.
Jayme Mathias
vivisseccao.blogspot.com

domingo, 12 de novembro de 2017

Universos paralelos

O universo permite a autocriação de microcosmos, cada qual com suas próprias leis. Estas leis não estão necessariamente interligadas, possuem independência e estrutura singulares. O único vínculo entre esses microcosmos possíveis é com a abertura do todo universal. Aqui nos deparamos com a relatividade do tempo, do espaço, com os universos possíveis.

A abertura da autocriação de microcosmos distintos permitiu as grandes metrópoles capitalistas produzirem os espaços fantasmagóricos. No interior desses ambientes vislumbramos a efetivação da relatividade einsteiniana. Resta-nos indagar: até que ponto os espaços fantasmagóricos influenciaram a relatividade física, ou a relatividade teórica contribuiu na constituição fantasmagórica?

Outro atributo proveniente da abertura cósmica se manifesta na produção da linguagem pragmática e seu jogo linguístico. As estruturas lógicas linguísticas somente tornam-se possíveis dentro da abertura microcósmica do universo.

Todas essas estruturas somente são possíveis devido a abertura material do cosmos. O que leva a matéria a se estruturar em suas singularidades cósmicas? O Ser é aquilo que permite tal associação.

Por Paulo Victor Albuquerque

domingo, 5 de novembro de 2017

No love

Ser poeta sem falar de amor.
É retirar a carne da dieta do predador.
É ser constante aluno, nunca preceptor.
Não sei falar de amor.
Seja pelo clichê, ou pelos porquês que sempre circundam as paixões.

Falar de amor exige a dor de perder, de não ser correspondido, de sentir a rejeição ou do constante perigo de cair aquém de alguém que não te quer.
Falar de amor é falar de sofrer, não por si,  mas por alguém que é tão imperfeito quanto você.
"É ferida que dói" e se vê!
É desejo sempre latente, mas também atitude de inconsequente.
Eu prefiro a dor daquilo que consigo ver.
Prefiro a razão. Não dar vazão para aquilo que até a alma é capaz de corroer.
Amor foi feito para ser sentido não escrito.
Permaneço então um poeta vegano
seguindo a dieta de restrição evitando  uma alimentação estabanada.
Agora percebo que é tão verdade o que disse antes que do amor falei, falei e não disse nada.

Por Júlio César Barbosa
vivisseccao.blogspot.com