domingo, 25 de julho de 2021

Julho do Leitor: Das vozes que me compõem

Como iniciar uma escrita que seja permeada por potências de vida? Isso soa tão difícil ao estarmos imersos em afetos tristes...  fico à espreita de encontros com corpos que potencializem a vida... 

Deixei-me habitar pelas inúmeras forças e intensidades que me atravessam durante uma aula, uma conversa, um brincar, uma leitura. Precisei reinventar-me perante a este cenário, onde as paredes de casa presenciam muito mais coisas do que antes, paredes que se tornam também local de labor, paredes que não somente acolhem e aconchegam durante o descanso de um dia longo vivido “lá fora”. Paredes que hoje nos separam de nós mesmos, em um caso singular de saúde pública, questão de vida ou morte, e tudo que perpassa essa ideia de viver e morrer.

Uma busca incessante de agarrar provisoriamente alguns dos movimentos que me capturaram em meio a escritas, informações, imagens, e que me escapam com sua força mobilizadora e arrebatadora. Onde marcas são deixadas umas por cima de outras, marcas pequenas, grandes, rachaduras, infiltrações, sulcos e porosidades que me habitam e coexistem. Justapostas, sem uma ordem a priori. Coexistência de tempos e atualizações de memórias. Estando à espreita do que pode acontecer na produção deste tear artesanal descontínuo chamado vida.



Relações de forças e intensidades que pedem passagem e atravessam o corpo criando potências. Pode ser um afeto, que nos toca, perturba, abala... São processos onde participam diversos componentes que se contagiam, que se compõem. Como uma maçã, que foi arremessada por um galho em sua maturidade, e ao cair no chão, intensidades a atravessam, a arrebatam. Diversos componentes, forças e corpos a atravessam em um estado sinérgico... mudando seu corpo, tornando-a outra, quem sabe, semente...

Me tornei paseandera, recolhi fragmentos, me tornei estrangeira de mim, criei espaços ainda desconhecidos. E nessa viagem subjetiva fui me compondo com diferentes paisagens de mim mesma, sem volta, sem permanência...

Marcela Bautista Nuñez


domingo, 18 de julho de 2021

Julho do Leitor: Nostalgia

 


O doce orvalho das birras de minha meninice

Rapidamente se transformou em gotas gélidas na maturidade

Fazendo-me ter saudade dos tempos de pueril tolice

Desejando retroceder o relógio voltando noutra idade

Do dejejum da manhã e preocupação simples em o que assistir

Agora o turbilhão constante de pensamentos inenarráveis

Transfiguram-me em um ser duvidoso e confuso quanto ao por vir

E é initeligível o farfalhar violento desses dizeres inefáveis

Jean Sousa Pinto


domingo, 11 de julho de 2021

Julho do Leitor: Há momentos que o peso da vida é ciclópico

Há momentos que o peso da vida é ciclópico.
Atmosfera fatigante, encoberta de blocos de fumaça sem vida.
Corpo dilacerado, delongado  entre inércias sombreadas.
Uma parte de mim almeja o pulsar visceral, embora o despenhadeiro acolhe-me aconchegadamente.
Quero inebriar-me na sua volúpia.
Contrações lunares ao desprenhar um novo ser.

Elaine A.

domingo, 4 de julho de 2021

Julho do Leitor: Buraco Negro

 

Sua existência provada como uma faca crava em nossos corações. Ora, como se já não nos bastasse a baixeza da nossa mediocridade intelectual para com o sussurro das folhas e dos pássaros.

Mas o sofrimento aqui é vento, sopra forte e isento. Que até parece acalento, mas enchem reservatórios de lágrimas e de suor, em plena noite de frio entregue ao relento.

Ecologia dos doentes, frente a terra plana dos dementes e o meu corpo que sente a singela conexão com o pó. Uma dor de dente me acomete, adiante de mais um ente querido que adoece, o que é isso?! Pensa o jovem enquanto adormece.

Mas que complacente, o meu corpo, que teima em lembrar-me que és pó, puro pó.

Falo aqui do meu ócio, que desintegrou os meus ossos e me pôs em meu lugar...

Noite fria do sertão estrelado, nebulosas no céu e eu penso firme enciumado: que a via láctea tem uma escada, ao qual nos leva da água, ferro, prata, ouro à glória do espaço-tempo.

E nem mesmo à vontade, maldade, amor e bondade, escapam a atração da verdade, que nos leva ao encontro de uma nave, que do alvorecer ao crepúsculo de nossos tempos, nos oferece viagem num murmúrio quase que sem vontade: é tempo de voar.

Repetirei na vantagem, que escapa à mim e à idade - estão certos, há tanto tempo que nem mesmo a relatividade esteve tão à vontade pra dizer: da luz ao pó.


Luiz Tiago Soares