domingo, 14 de junho de 2020

Monocromático


Mesmo o uníssono tem vários sons.
Daquela própria briga pela compreensão do "Uno", ou da "Díade" eterna, se especula que surgiu o outro, como aquilo ao qual se contrapõe, como uma necessidade, um complemento, ou um nêmesis.
Cristalizou-se na sociedade a individualidade, subjetividade em que tudo é relativo, tudo "visto de um ponto".
Motivo para o qual aquilo que não era EU de repente passasse a ser avesso a mim, ou ainda, tudo aquilo que almejo ser.
Desejo e aversão, sim e não. Aquilo a que digo sim é bom pra mim, aquilo que nego, ruim. Rotulamos assim, conceituando, em pequenas latas de visão limitada, tudo que nos é alheio. E classificamos de quais delas queremos proximidade, ou distância.
Bem, tenho a ligeira impressão de que a existência não obedece à ordem de nossa estante de latinhas. Talvez seja mais como um oceano cheio delas. Estamos a sua mercê. Encontraremos incontrolavelmente com elas, sejamos a elas abertos, ou avessos. Encontros.
Buscamos ser especiais e únicos, mas mesmo o uníssono tem vários sons, como entre preto e branco existem vários tons. Temos cada um também vários dons.
Buscamos independência, enquanto atestamos a constatação da falta que sentimos, ao mesmo tempo em que bradamos aos quatro cantos o quão nada nos faz falta. Autossuficiência é um conceito orgânico, mecânico, não social. Ninguém vive só. Ninguém vive em repouso. Viver é movimento.
Fato é que, talvez haja verdade no pêndulo de Schopenhauer, que resume a vida como constante oscilação entre angústia e tédio. Que a vida seja doença e remédio vá lá, mas só isso? Ela é muito mais. Doença e remédio, ambos munidos de amargor, antes da doença, no entanto, havia doçura da saúde e depois do remédio, a cura. A vida não é repouso. Nem quando estamos parados. É movimento entre sim e não, alívio e aflição. É muito mais que optar pela sede, ou pelo bucho cheio d'água. É também o primeiro gole, garganta seca sendo molhada pela água gelada.
A questão poética que afligia William talvez não fosse "ser ou não ser", mas tudo aquilo que está entre eles.
Nem mesmo o monocrático contém  uma só cor.
Tendo então esboçado essa tentativa filosófica parca, fico por aqui entre o silêncio e a tagarelice, na justa medida Aristotélica.
Talvez viver entre os extremos não seja ser medíocre, mas prudente.

Júlio César 

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