domingo, 3 de novembro de 2019

Rogério, o laboratório do céu não tem estrelas.

Quando Rogério Skylab escreveu sua coletânea de sonetos “Debaixo das rodas de um automóvel”, ele sabia bem quem era o seu público. Não me refiro à análise daqueles que propõe uma percepção cômica de sua obra, pautada em uma loucura consciente, mas aos espectadores das grandes metrópoles pós-modernas, que consomem o mundo descartável enquanto transitam entre fluxos sensoriais com seus choques do inconsciente. O consumo descartável, que lê com os olhos, sem profundidade, na leitura dentro do ônibus, no intervalo da programação, do cronômetro enquanto o arroz seca. Curto. Rápido. Um corte. É a vida tanto do escritor quanto do consumidor de plástico contemporâneo. Skylab: poeta da superfície. Neurótico melancólico da metrópole. Serial Killer da produção.
Lembro-me quando começamos o processo de vivissecção do corpo social em nosso blog e compreendi um pouco mais como é estar debaixo das rodas. O fluxo nos transpassa. Na linha de produção a vertigem não escapa do texto, o papel (tela) é o leito do tombo. O dissecar nada tem de cirúrgico, não é um processo prolongado, não visa a cura. Ele é uma fábrica serial do corte. O corte não é para o abate, não consumimos a carne. Somos descartáveis, tanto quanto o saco preto que cobre o cadáver. O tempo infernal, que é o agora das grandes cidades, nos obriga, cada vez mais, a cortar apressadamente a carne. Não há tempo para todo o tempo do mundo.
Aqui estamos novamente, tu e eu, na mesma linha de produção. O que nos separa de Rogério Skylab é somente o modelo do automóvel, máquina desgovernada sem freio de mão. Enquanto tomamos um café, em mais um dia de labor, escrevo esse texto para justificar minha breve despedida.
Fim do intervalo, ao sair não esqueça de descartar.

Paulo Victor de Albuquerque Silva.

Um comentário:

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Jayme, Júlio e Paulo.