domingo, 3 de maio de 2020

Poema de quarentena




Pensamento preso entre quatro paredes. Se me imagino fora, quero correr, não posso.
Desligo as redes, me inundam o ser daquilo que não quero.

Na escrivaninha,
caneta e papel disputam espaço lado a lado com dipirona e álcool gel. 

Deito na rede, mudo de cômodo. Sem ver o céu.
Mato a sede da sensação de voar. Me balanço com força.

Busco a todo custo a fuga do incômodo, cerro os olhos, me transponho, em campo aberto, sonho o concretizar do incerto.
Procuro sentir o longe perto, quem sabe curo a angustia de estar, sem poder. É tudo muito brusco...

Me espremo em um canto que não dos pássaros, mas onde não ouça os passos dos impacientes de casa.

Ao supremo peço em oração que sejamos antes impacientes, que pacientes a procura de um leito que não existe.

Na bolsa, o dólar sobe, o petróleo despenca.
Circuit Breaker no pregão
me pergunto quanto estará a cotação do aperto de mãos?

Leve moleza, desconfio! Segue o fio! Sinto frio nas horas mais quentes do dia. Será? Deve ser só ansiedade. Tremo, temo o arrastar das horas.

Desenham-se senhoras que seguem em marcha lenta no meio da calçada, travando sua luta com a idade.
"Como se fosse possível matar o tempo sem ferir a eternidade."

Convivência forçada. Não há segredo.
Até respirar, dá medo.
Pandemia convertida em pandemônio.
Pantomima travestida em feromônio.
De feras "civilizadas" acuadas pelo invisível.

Me policio como nunca. Dúvida invade.
Sinto cheiro? De quê? Suspeito. 
O peito dói. Corona? Não.
Saudade!

Saudade de fora, da mesa de bar, de cheiros, lugares, amigos, e ares, causos, andares, tolhidos e mesmo daquele perigo só de estar no aberto. 

Só vejo Máscaras, queria mais caras.

Do Covid só espero sair com vida, o isolamento do lamento. 
Me permitir um estardalhaço.
Presenciar o ressignificar do abraço e do arrochamento dos laços se engodando em nós cegos que tempo ou doença alguma, são capazes de desatar.

E esperar, na fé, na ciência, na data limite de Chico Xavier, na consciência, na divina providência, no que for...

Que o Covid, convide todos a perceber que, apesar de parecer, uma letra a mais ou a menos, faz toda a diferença na distância de um abismo que separa livre de live.

Júlio César 

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