domingo, 13 de outubro de 2019

Infante

Lira sempre foi forte, de um jeito que eu sonhava ser, bem como quando as telas nos iludem. Forte. Passava o dia inteiro mergulhada na vida, encontrava nas veredas sempre o destino, às vezes o acaso. Era de fácil conversa, de bom ouvido, daquelas que escutam o silêncio, ouvem o som do abismo.
Nunca esqueço o dia que teve uma conversa com um senhor de rua. Os céus sabiam dar seu tom ao diálogo, grunhiam, até tudo desabar sobre suas cabeças. Lira absorta, não ouvia os anúncios do céu, tinha ouvidos para o velho, ele era gigante, desmontou Lira.
Voltou pra casa debaixo da tempestade. A chuva era tanta que afogou suas lágrimas. Ninguém percebeu, era somente roupa molhada.
- Cuidado com o resfriado, tire essa roupa.
O vestido novo saiu, mas a roupa encharcada de sofrimento posta pelo velho, dormiu em seu corpo.
Daí em diante nada foi igual, o gosto das coisas mudou, as nuvens lembravam nada além de chuva.
- Antes elas tinham o peso do algodão.
As conversas encontraram novos rumos, estava perdida. Na estrada, as placas sinalizavam todos os caminhos, nenhum era ela.
De volta ao lar, só havia uma pessoa que poderia acionar o alarme de incêndio. Deságua em mim.
- Eu juntarei os seus pedaços.
Disse.
“Em mim”? Seria Lira… eu?

Paulo Victor de Albuquerque Silva.

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