domingo, 17 de junho de 2018

Entre cães e pães

Os cachorros, dizem, sentem cheiro do medo. Esses que aqui latem todo dia fogem da regra. Porque se assim fossem me devorariam por inteiro. Mas eu vivo. Vivo e sinto antes de pensar. Sinto até livre, porém responsável. Sem compromisso, mas o tendo. Sem liberdade, mas a tendo. Querendo o ritmo do dever, mas sem querer. Exigente com o que faço. Livre para exigir. Como se tivesse aberto em mim a possibilidade de se abrir. Florescer. E não o fosse por completo. Nunca. No mínimo de soltura, tensão. Na abertura, prisão. Prender como quem escapa da jornada com que meu dever fizera livremente. Prender como quem escapa do próprio ritual criado. Hábitos breves, dos quais os leves não sinto poder. Exigência do querer ou não querer. Como se no momento do ápice liberto, gastasse em demasia a energia para me prender. Condenado ao ato livre. Condenado a não poder. O infinito delírio do ter que fazer. Os olhares me demonstram um tempo que com nada disso se importa. Eu poeta, solto e aberto, fechado e manifesto do ter que ter, do ter que fazer. Mas é isso que fazem os pedreiros erguerem as colunas do nosso tempo. Os papéis assinados dos grandes negócios! Os pães, até os pães diários e seu cheiro de tensão! Dos pães aos especialistas! Dos piores aos recordistas! No meu caso é prisão e preguiça!

Por Jayme Mathias Netto
vivisseccao.blogspot.com

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