domingo, 10 de setembro de 2017

A guerra dos Fonsecas

Fonseca, general experiente de inúmeras guerras, que como todo ser vivo, encontrou vitórias e derrotas ao longo de suas batalhas. No auge dos seus quarenta e poucos anos já passou por diversas pelejas orquestradas pelo destino: possuiu duas famílias, incontáveis amores, metros de cabelos cortados, bigode sempre afiado. De todas suas vivências nada se compara ao campo de batalha. Nele o corpo se presta a um estado limite entre sua constituição e a fissura, mutilação. Não há momento mais severo, mais engajador. A trepidação da metralhadora se propaga em suas células, repetição acelerada que lhe traz o prazer sexual. O choque do tiro, da luz, da bomba, do inimigo inesperado, tudo pulsa num campo de tensões.
Aí você lendo esse texto, criando as imagens do Fonseca em sua mente dentro do lugar de combate, relacionando sua imaginação com algum filme que já assistiu ou coisa semelhante. Você consegue envolver seu corpo com esse texto mais do que o Fonseca com o campo de batalha? Não. O empenho do corpo dentro do combate é completo, a tensão dos músculos, o estalo dos ossos, o ranger dos dentes, o estômago virado.
Acho que foi na primeira quinta-feira do ano passado: Fonseca estava em um novo conflito, tudo normal, corpos dilacerados, córregos de sangue, o velho cheiro de suor e morte, mas algo estava estranho, o nosso general assistia todo o espetáculo da técnica do mesmo modo como presenciava o jantar em casa, as reuniões no quartel, o coito com seus amores. Sabe o que é isso Fonseca? O tédio. Agora sim leitor, não há mais diferença entre sua imaginação e o campo de batalha do novo Fonseca, entre o seu dia, sua vida, e a de mais ninguém. Se o prazer de viver está na luta, e se tudo agora é mais do mesmo, por que continuar na guerra? É na ausência do prazer que a falta de sentido do existir nos aparece. E haverá um dia em sua vida que eu retornarei para narrar o seu desespero também.

Paulo Victor Albuquerque
vivisseccao.blogspot.com

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