domingo, 14 de maio de 2017

O estômago

Platão não foi o primeiro a pensar em formas variadas de alma, para alguns povos antigos os mais variados órgãos do corpo também possuíam alma, já que cada um deles detêm movimentos próprios. É sobre isso que o filósofo fala. Existe uma entidade dentro de “seu corpo”, que vive. Ela vive, mas agora foi possuída pela consciência que fala. Em cada ponto da consciência. O órgão não para. E se somente podemos falar sobre aquilo que pode ser dito, o estômago fala. Encontramos uma aporia: tudo que perpassa o tempo tem necessariamente memória? Será que para a efetivação da memória faz-se forçoso uma consciência? A consciência da memória já não pressupõe a existência, na própria matéria, da abertura à reminiscência?
O estômago perpassa o tempo, ele tem memória sua. Independente da consciência do filósofo o seu estômago reage às intervenções daquilo que encontra-se com ele, gerando cicatrizes que são as marcas do passado. A consciência filosófica pensa as cicatrizes, as marcas do tempo do estômago, tudo já estava lá. Para o estômago nada disso é resposta, muito menos dúvida.
Nós, almas penadas procuramos corpos para poder possuí-los como uma possessão profana, então falamos por sua boca, mas não é ele quem diz. Nós somos seres possessores, já diria Wittgenstein, falamos por meio da consciência o que o corpo-boca nunca poderia dizer. Neste sentido, a linguagem nunca passa de uma possessão de corpos. A memória nunca diz, ela sempre está lá, na matéria, em suas marcas, nos seus rastros. Mas para que se preocupar se no final das contas o estômago não passa de um filósofo...

Por Paulo Victor de Albuquerque Silva
vivisseccao.blogspot.com

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